Falta de paciência com o procedimento de contratações
A complicação na contratação de novos talentos foi o primeiro obstáculo na relação. Reconhecido por sua agressividade no mercado, Alexandre Mattos se deparou com um processo mais moroso no Vasco. A autorização para contratar um jogador precisa passar por avaliações dentro da empresa antes da negociação avançar.
Logo de início, Mattos sugeriu uma série de reforços à SAF, mas poucos foram aprovados pelo grupo. O executivo demorou a se adaptar ao procedimento, diferente do que tinha experienciado em trabalhos anteriores.
Durante a janela de transferências, com a dificuldade em trazer os nomes desejados e a pressão da torcida por contratações, começaram a surgir rumores de que o diretor aguardava apenas a autorização da 777 para firmar com certos atletas. Isso desagradou a empresa, que interpretou como uma forma de pressão pública.
Internamente, indivíduos da 777 sugeriram que o dinheiro disponível para contratações poderia ter sido empregado de modo mais eficaz. A SAF alega que a falta de autonomia não foi um problema. Mattos teve mais de R$ 100 milhões para investir em reforços e escolheu, com a aprovação de outros setores, nomes como João Victor, Adson, David, Sforza, entre outros.
Apesar da confiança no trabalho do diretor, por se tratar de um profissional experiente e com histórico vitorioso, a janela de transferências teve pouca influência na demissão. A quebra de confiança, principalmente com o vazamento de informações e relatos considerados nocivos à empresa, resultou na decisão.
Entrevista coletiva causa desconforto
Em 6 de fevereiro, a impaciência de Mattos com a burocracia da 777 ganhou destaque público. Durante a coletiva de apresentação de Adson, Victor Luís, Galdames e Keiller, o diretor de futebol deixou claro seu desagrado com a demora no processo interno de contratações.
“- Devo compreender que a palavra final não é minha. Eu indico alguns caminhos que eu seguiria. Alguns são aceitos e outros não. (…) Em menos de 24 horas, já propus duas ou três opções (para substituir Paulinho e Jair). Estou esperando aprovação. Se aprovarem, virão – mencionou Mattos na ocasião.
As declarações caíram mal dentro da empresa. A partir daí, o diretor tentou suavizar o clima com postagens nas redes sociais, nas quais demonstrava tranquilidade em relação aos processos e afirmava estar plenamente adaptado ao cotidiano da SAF.
Episódio envolvendo André Silva
A negociação com o atacante, que optou por fechar com o São Paulo, desencadeou o ápice da crise. Na ocasião, o ge trouxe duas versões sobre a transação: uma sob a perspectiva de indivíduos ligados à SAF e outra com a visão do diretor de futebol.
1. Na primeira interpretação, o nome de André Silva foi sugerido pelo auxiliar técnico Emiliano Díaz no final de janeiro. No início de fevereiro, Mattos buscou dois jogadores com perfil semelhante – Breno Lopes e Pedro Henrique. Ambos foram vetados pela 777. A proposta por André Silva foi encaminhada à empresa americana para a aprovação do orçamento somente na semana de 19 de fevereiro. Em 22 de fevereiro, a 777 validou a contratação do atleta, por um montante próximo a 4 milhões de euros (R$ 21 milhões).
2. Outra versão indica que o primeiro contato visava o empréstimo de André Silva, pois inicialmente não havia orçamento. A negociação persistiu por aproximadamente 10 dias, porém o Vitória de Guimarães não concordou. O perfil do jogador foi prontamente aceito pela 777, mas a necessidade de transformar a direção da negociação para uma aquisição demandou liberação de verba, o que prolongou o processo. Mesmo assim, a SAF concordou em investir. A transação não se concretizou porque o atleta optou pela oferta do São Paulo.
Há quem afirme que Mattos deixou de lado o nome de André Silva por preferir os outros dois jogadores que estavam em pauta naquele momento. Em contato com o ge, o diretor negou parcialidade e reiterou que o nome de Pedro Henrique era sua opção favorita e da comissão técnica, mas não da 777.
Relação com a equipe técnica
A situação gerou atrito também com a equipe técnica, que chegou a demandar uma explicação sobre André Silva. Na ocasião, o CEO Lúcio Barbosa foi quem informou a Emiliano Díaz sobre o progresso da negociação. O auxiliar ficou descontente com a postura de Alexandre Mattos, mas não tomou a iniciativa de abordar o diretor a respeito.
O ponto mais crítico foi o vazamento na quarta-feira de imagens de uma conversa de Mattos na qual ele justificava o motivo de não ter contratado André Silva. A exposição de informações incomodou sobremaneira a SAF.
Apesar do desentendimento, Alexandre Mattos se encontrou com Ramón e Emiliano para traçar planos para a intertemporada e discutir sobre reforços. O diretor até sugeriu novos nomes à 777. Após a demissão na quinta, recebeu uma ligação de agradecimento da equipe técnica.
Os membros argentinos da equipe técnica compartilham um ponto em comum com Mattos: o empresário André Cury mantém boa relação com o gestor e foi o responsável pela contratação de Ramón e Emiliano pelo Vasco. O agente também representa David, contratado em janeiro, e Breno Lopes, que interessou ao clube. Lúcio Barbosa chegou a abordar o diretor de futebol sobre a relação com o empresário, o que desagradou a Mattos.
Movimentação para deixar o Vasco
Dentro do Vasco – com informações acessíveis tanto à direção da SAF quanto ao setor associativo -, havia descontentamento com a tentativa de Alexandre Mattos de sair do clube pouco tempo após sua contratação. Os dirigentes tomaram conhecimento de que Mattos havia buscado a CBF para ocupar a vaga atualmente preenchida por Rodrigo Caetano, o que desagradou o atual diretor de seleções da CBF, ex-Vasco em duas ocasiões.
Por conta desse comportamento, Lúcio Barbosa mencionou nas últimas semanas que considerava a possibilidade de dispensar Mattos em breve. Essas mesmas informações chegaram aos contatos do Corinthians antes da contratação de Fabinho Soldado. No mercado futebolístico, a informação circulava. Era evidente o descontentamento com os processos da 777 semanas após sua chegada.
Relação com os atletas
Outra questão da crise foi a relação do diretor com os jogadores. Funcionários do departamento futebolístico do Vasco alegam que surgiram problemas entre o gestor e parte do elenco. Alguns atletas reclamaram da ausência de Mattos no dia a dia de trabalho.
A relação azedou, sobretudo, com Medel. O chileno é capitão da equipe e amigo de Ramón e Emiliano. O zagueiro chegou a discutir com Mattos e deixar a sala durante uma reunião com o diretor. Outros jogadores seguiram o exemplo.
Mattos em confronto
O comportamento de Mattos nas últimas reuniões desagradou a SAF. O diretor entrou em confronto e cobrou a 777, solicitando mais autonomia para operar e buscar contratações. “Fui contratado para quê?”, teria questionado.
Em breve diálogo com a reportagem, o diretor alegou divergência de ideias e afirmou acreditar que essa postura mais combativa determinou seu afastamento do Vasco.
“- Tenho uma visão, a empresa tem outra. Simples assim.”, resumiu Mattos.
Alexandre Mattos foi informado da demissão horas antes da convocação da coletiva de imprensa por Lúcio Barbosa, no início da tarde desta quinta-feira.
Fonte: ge