Os jogos da Seleção Brasileira na década de 80, no Maracanã, foram responsáveis por criar alianças entre as torcidas do Flamengo, Vasco, Corinthians, Palmeiras e São Paulo.
A organização das torcidas de Flamengo e Vasco no estádio foi o ponto de partida para essa união. Assim como nos clássicos entre os clubes, as torcidas rubro-negras ficavam à esquerda das cabines de rádio, enquanto as cruzmaltinas ocupavam o lado direito.
Essa divisão também se manteve nos jogos do Brasil naquela época. De um lado, a Força Jovem do Vasco junto com a Mancha Verde, do Palmeiras. Do outro, a Raça Rubro-Negra, a Torcida Jovem do Flamengo e a Gaviões da Fiel, do Corinthians.
A amizade entre a Jovem Fla e a Independente, do São Paulo, ganhou força devido à rivalidade com os palmeirenses, estreitando os laços durante um jogo entre Brasil e Chile, válido pelas Eliminatórias da Copa de 90.
– Peguei a faixa da Independente, fui sozinho para o Maracanã e fiquei ao lado da torcida do Flamengo. O outro lado era do Vasco. O pessoal da Jovem Fla já estava acompanhando o que estávamos fazendo com a torcida do Palmeiras, e falaram: ‘o Adamastor é o cara que está batendo de frente com eles’. Aí o Capitão Léo [antigo presidente da TJF] me convidou para ficar com eles. Primeiramente, construímos uma amizade pessoal, e isso se estendeu para a aliança das torcidas.
Reginaldo Tadeu de Souza, o Adamastor, ex-presidente da Independente
O livro “Nada do Flamengo, Tudo pelo Flamengo”, de Bernardo Buarque de Hollanda, confirma o episódio:
A presença das torcidas organizadas nos jogos da Seleção Brasileira no Rio de Janeiro era comum naquela época e ocorreu durante toda a década de 1980. Adamastor, líder em ascensão na Independente, vai ao Rio representar sua agremiação e estende uma faixa no alambrado das arquibancadas com a inscrição da torcida. É nesse contexto que Adamastor estabelece contato com Capitão Léo, Ricardinho e outros membros da Jovem.
O presidente da Força Jovem do Vasco naquela época, Roberto Monteiro, recorda que a aliança com a Mancha Verde já existia há um bom tempo, mas ressalta a importância dos jogos da seleção brasileira para formalizar a tradição de receber as torcidas amigas em seus respectivos territórios.
– Com relação à Mancha Verde, recordo que eles vinham para os jogos da Seleção Brasileira e ficavam ao nosso lado, devido à rivalidade já existente entre nós e o Corinthians, e entre eles e o Flamengo. Os jogos da Seleção Brasileira acabaram contribuindo para aumentar essa rivalidade. Foi assim que começaram a criar esse hábito de nos recebermos mutuamente.
Roberto Monteiro, presidente do FJV naquela época
Nessa disposição nas arquibancadas, era comum ouvir os tradicionais cânticos de provocação aos rivais dos clubes envolvidos, mesmo se tratando de um jogo da seleção brasileira.
No entanto, não há registros de violência nesse período, mesmo em jogos que reuniam diversas organizadas rivais no mesmo local.
Bebeto e Romário incendiavam duelos nas arquibancadas
Além disso, a presença da icônica dupla Bebeto e Romário em campo transformava os jogos do Brasil em verdadeiros Flamengo x Vasco nas arquibancadas.
Na década de 80, Bebeto conquistava títulos pelo Flamengo e Romário pelo Vasco, o que os tornava ídolos de suas respectivas equipes.
– O Maracanã sempre teve uma divisão clara: de um lado a torcida do Vasco e do outro a torcida do Flamengo. Mesmo nesses jogos da seleção, os vascaínos ficavam de um lado e os flamenguistas do outro. Quando saía gol do Bebeto, uma torcida comemorava mais de um lado do que do outro, fato. E quando saía gol do Romário, a torcida de um lado comemorava mais do que a outra, fato.
Eric Faria, repórter da TV Globo no documentário “A Mão do Eurico”
Curiosamente, Bebeto acabou se transferindo para o Vasco após a Copa América de 89, em uma das transferências mais polêmicas da história, enquanto Romário foi para o Flamengo em 1995, após conquistar a Copa do Mundo no ano anterior.
Organizadas sob investigação do Ministério Público
A “divisão ideológica” nas arquibancadas do Maracanã, durante os jogos da seleção brasileira na década de 80, aos poucos foi perdendo força e atualmente não existe mais, principalmente após a reforma do estádio para a Copa do Mundo de 2014.
Hoje em dia, as organizadas do Flamengo e Corinthians cortaram seus laços. Por outro lado, a Torcida Jovem do Flamengo e a Independente, do São Paulo, continuam aliadas, assim como a Força Jovem do Vasco e a Mancha Verde, do Palmeiras.
Além disso, a Raça Rubro-Negra, a Torcida Jovem do Flamengo e a Força Jovem do Vasco, que tiveram um papel central nestes acontecimentos, foram proibidas de frequentar os estádios brasileiros pelo Ministério Público devido a episódios de violência.
Fonte: ge