O primeiro jogo do Campeonato Nacional Brasileiro deste final de semana dá continuidade a uma tendência já consolidada. Quase metade das equipes inicia a competição sob a orientação de técnicos estrangeiros. Esse movimento, antes considerado uma ‘moda’, agora se firma e reverbera até mesmo na Europa.
Impacto de Jesus e Abel
O aumento no número de treinadores estrangeiros no Brasil vem sendo observado desde 2019, impulsionado principalmente pelo êxito de Jorge Jesus no Flamengo.
Entre o início da era dos pontos corridos, em 2003, e 2018, apenas 17 técnicos de outras nacionalidades passaram pelo Brasileirão. A partir de 2019, esse número mais que dobrou.
A temporada de 2020, por exemplo, contou com três estrangeiros comandando equipes no início do Brasileirão: Eduardo Coudet (Inter), Jorge Sampaoli (Atlético-MG) e Domenèc Torrent (Flamengo). Esse cenário se ampliou para sete com as chegadas de Abel Ferreira, Sá Pinto, Emiliano Diáz e Gustavo Morínigo. Vale destacar que Rafael Dudamel e Jesualdo Ferreira nem chegaram a estrear na Série A, pois foram demitidos previamente.
A presença de treinadores estrangeiros, mantendo-se alta ou em ascendência a cada ano, tem se tornado recorrente. No início do Campeonato Brasileiro de 2021, por exemplo, já era possível identificar cinco técnicos estrangeiros, totalizando oito ao longo do torneio com as trocas de comando.
No ano seguinte, após o sucesso de Jorge Jesus, Abel Ferreira reforçou a preferência por treinadores estrangeiros. Campeão da Copa do Brasil e da Libertadores pelo Palmeiras em 2020 e 2021, o treinador português estimulou ainda mais contratações nesse perfil.
Em 2022, a atual edição do Brasileirão teve início com nove treinadores estrangeiros à frente das equipes, ou seja, quase metade dos times participantes contava com treinadores estrangeiros. Esse número chegou a 11, ainda que não simultaneamente, ao longo da competição.
No ano passado, foi estabelecido um marco significativo. Pela primeira vez, o Brasileirão contou com mais treinadores estrangeiros do que brasileiros em atividade simultaneamente. Essa situação ocorreu no final de julho, quando Coudet (Inter), Bruno Lage (Botafogo) e Ramón Díaz (Vasco) foram anunciados.
A edição anterior do Brasileirão, por sua vez, teve início com 10 treinadores estrangeiros, chegando a 14 com as alterações de comando ao longo da competição.
Neste ano, o Campeonato Brasileiro começa com oito estrangeiros no comando técnico: Gabriel Milito (Atlético-MG), Arthur Jorge (Botafogo), António Oliveira (Corinthians), Juan Pablo Vojvoda (Fortaleza), Eduardo Coudet (Inter), Abel Ferreira (Palmeiras), Pedro Caixinha (Red Bull Bragantino) e Ramón Díaz (Vasco).
A tendência ainda é vista como uma ‘moda’, impulsionada pelo sucesso de Abel Ferreira no Palmeiras. No entanto, a cada dia, essa percepção se atenua. Os clubes brasileiros passaram a contratar treinadores estrangeiros assim como contratam jogadores estrangeiros. Em geral, eles representam uma opção mais acessível financeiramente se comparados aos treinadores brasileiros, mantendo um nível de sucesso internacional. Além disso, observa-se uma renovação limitada no topo da hierarquia dos técnicos brasileiros. Dessa forma, muitas vezes, os clubes optam por estrangeiros como uma forma de diversificar, afastando-se dos ‘mesmos de sempre’, um grupo de 20 técnicos que costumam atuar na Série A e que são vistos com certa desconfiança por parte de muitos torcedores. Assim, a ida ao exterior para buscar profissionais que não estejam tão desgastados no mercado brasileiro se torna uma opção atrativa.
Rafael Reis, colunista do UOL
Sucesso reverbera na Europa
O interesse por treinadores estrangeiros no Brasil também tem impacto do outro lado do oceano. Anteriormente, os técnicos estrangeiros encaravam com desconfiança a instabilidade do cenário brasileiro, mas atualmente o mercado tem se mostrado atrativo para eles.
Ainda que o interesse do primeiro escalão de treinadores portugueses não tenha despertado, os profissionais em ascensão do país de Jesus e Abel já consideram o trabalho na Série A como uma possibilidade concreta.
Embora o público português mantenha um interesse limitado no futebol brasileiro, mesmo após os êxitos de Jorge Jesus e Abel Ferreira, a situação é diferente quando se trata dos treinadores. Os técnicos portugueses que não estão no primeiro escalão veem o Brasil como um mercado promissor, onde é possível obter uma remuneração vantajosa e vivenciar uma realidade distinta. Os portugueses, em geral, apreciam desafios e experiências culturais novas, o que justifica a presença de diversos profissionais lusos recentemente no futebol brasileiro. Porém, os treinadores portugueses mais renomados, sejam jovens ou experientes, geralmente buscam oportunidades maiores dentro da própria Europa.
Bruno Andrade, colunista do UOL
Fonte: UOL Esporte