Um dos personagens da base do Vasco na temporada, o meia JP tem percorrido um árduo caminho, desde que saiu de Goiânia em 2019, para conquistar seu espaço no clube. Segundo volante com boa chegada à frente, o jovem de 18 anos fez o gol vascaíno na derrota por 2 a 1 para o Flamengo no jogo de ida da final do Campeonato Carioca Sub-20. A partida de volta será neste sábado, às 15h.
João Pedro chegou ao Rio de Janeiro há mais de quatro anos depois de começar a jogar futebol na base do Goiás. A vinda ao Vasco tem dedo do pai Murilo Morais e sua câmera e participação fundamental do neto de um dos maiores jogadores da história do Brasil, Garrincha.
Quando JP ainda defendia o Goiás, a qualidade dos vídeos gravados por celular era muito baixa, e seu pai decidiu comprar uma câmera para registrar os jogos do filho.
– Foi uma nota, paguei em várias parcelas (risos) – lembrou Murilo.
O investimento valeu a pena mais tarde. Naquele momento, Murilo começou a olhar para fora de Goiânia. Queria que o filho tivesse contato com outras estruturas e vivenciasse experiências no eixo Rio-São Paulo. Foi quando JP ficou uma semana na base do São Paulo e, posteriormente, no Corinthians. Nesse momento, o pai passou a ser orientado por Dunda, profissional que hoje trabalha no processo de captação do Palmeiras. O amigo abriu sua cabeça para outras oportunidades.
E é aí que entra o neto de Garrincha, o scout Luiz Bastos. Ele se deparou com os vídeos gravados por Murilo e postados nas redes sociais de JP e chamou o menino para vir ao Rio de Janeiro e ser observado pelo Vasco. O convite teve o aval do gerente Carlos Brazil e do captador da base vascaína Luan Faria.
– A gente queria, mas tinha medo. É sair de casa, dividir a família, fazer sacrifícios… Bancar isso é caro. Mas fiquei com aquilo na cabeça, a gente sempre foi muito grato ao Goiás, onde tudo começou, mas o João começou a querer vir para o Vasco. Ele só falava em Vasco – contou o pai do jogador.
Receoso de deixar o garoto, prestes a completar 14 anos, sozinho no Rio de Janeiro, Murilo decidiu se mudar junto com JP. Pai e filho foram morar na Barreira do Vasco: era perto de São Januário, onde o jovem iria jogar e estudar, e com um custo menor para uma família que agora passaria a ter duas bases: Rio e Goiânia.
– Comecei a acreditar no sonho dele. O sonho virou coisa séria, foi sacrifício e luta desde então. Foram quase seis meses sem ir para Goiânia. Foi bom, porque ele sentiu as dificuldades. E eu fiquei aqui vivendo a vida dele – disse Murilo.
JP deixou para trás a irmã Yasmim e a mãe Renata, que passou a tomar conta da empresa da família em Goiás. Murilo largou a administração do negócio e ficou responsável por cuidar da casa e do filho. O pai virou investidor e empresário do atleta. Mas os primeiros três anos foram muito difíceis.
O meio-campista pouco saiu do banco de reservas. Afinal, ele chegou ao Vasco para disputar vaga em uma geração (2005) que se tornou uma das mais vitoriosas da história do clube. Andrey Santos, vendido recentemente ao Chelsea, é apenas um ano mais velho que João Pedro. Marlon Gomes é outro que despontava como promessa da base vascaína. Concorrência pesada.
O ano de 2020, com a pandemia, foi um ponto de virada para o garoto. Com as atividades suspensas, ele passou a treinar com o pai, que não deixou a peteca cair e apertou aqui e ali para investir no desenvolvimento do filho. JP teve acesso a profissionais e trabalho específicos. No ano seguinte, quando foi para o sub-17, lutou contras suas valências e começou a ganhar minutagem.
– Em 2022 ele se firmou como segundo volante, ganhou praticamente tudo o que disputou, mostrou o trabalho dele. Falei com ele que seria o ano dele. A gente estava com medo pelas dificuldades que ele passava, angustiado por ter passado três anos no banco. Foram três anos de preparação, 2022 era o ano dele, e ele teve a chance. Temos muita gratidão pelo Vasco. Ele conseguiu chegar na seleção de base e apareceu como promessa. Esse ano foi para a Copinha – destacou Murilo.
Mas o que motivou de fato a virada de chave?
– Saudade da família. Esses anos que a gente está longe não tem dinheiro que vai fazer voltar. Não tem preço, o que tem é valor. Trabalho em conjunto da família deu certo – resumiu o pai.
– Ele sente que a mãe dele teve que assumir a administração da família lá, cuidar da empresa, da irmã dele para ele viver o sonho, comigo cuidando da casa e dele. A gente teve que se transformar, então é difícil. A base de tudo foi família. Ele enxergou que nós estamos lutando por ele, nós dividimos a família para ele conquistar o sonho – completou Murilo.
O sacrifício já começou a dar resultado no ano passado, quando JP foi campeão carioca, da Copa Rio e da Recopa Carioca, além de ter conquistado o vice-campeonato da Copa do Brasil com o Vasco. Ganhou espaço e se destacou pela categoria sub-17: foram 40 jogos, com seis gols e 11 assistências. Em maio de 2022, o meia assinou seu primeiro contrato profissional, válido até abril de 2025.
O jovem jogador disputou a Copa São Paulo de Futebol Junior com o Vasco nesta temporada, quando foi promovido ao sub-20, onde atuou em 19 dos 20 jogos de 2023. Em maio, foi chamado pelo técnico Ramon Menezes para um período de treinos com a Seleção sub-20 antes do Mundial da categoria.
– Todo momento é uma vitória, sou grato por tudo, é nos momentos difíceis que a gente se fortalece. De repente ele estava na Seleção ao lado do Marlon e do Andrey, emoção que não tem preço. Estamos trabalhando e aguardando a oportunidade de chegar ao profissional. É um sonho, depois de tudo que a gente viveu, o JP ser um cria do Vasco – concluiu Murilo.
O menino de perfil tímido, caseiro e 100% dedicado ao futebol entra em campo neste sábado em busca do título carioca sub-20. O Vasco, campeão da Taça Guanabara, recebe o Flamengo às 15h.
Fonte: Globo Esporte