Um dos protagonistas do sucesso do Vasco, com sete gols em nove jogos (já superando nomes como Gabigol, Yuri Alberto e Pedro na artilharia do Brasileirão), Pablo Vegetti não demorou para se adaptar após ser contratado de última hora durante a janela de transferências. Foi tudo tão rápido que mal teve tempo de se despedir dos pais.
Reinaldo Vegetti é um rapaz reservado, então foi Alejandra quem interrompeu a viagem para Bariloche, em comemoração às Bodas de Esmeralda do casal, para conversar com a reportagem do ge.
Estavam em Santo Domingo, um pequeno povoado com menos de 2 mil habitantes na província de Las Colonias, em Santa Fé, quando receberam a mensagem do filho: ”Estou indo e não volto mais”. Fizeram a corrida de quase 400 quilômetros até Córdoba para uma despedida rápida, ali mesmo no saguão do aeroporto.
– Não conversamos sobre isso – admitiu Ale, mãe de Pablo.
– Ele já tinha me dito que se surgisse uma equipe de fora, ele ia pensar muito bem. Mas quando mandou a mensagem, só conseguimos dar um abraço rápido e não o vimos mais. Foi assim.
Aos 34 anos e destaque no Belgrano, da Argentina, Vegetti estava prestes a acertar com o América Mineiro, mas o Vasco atravessou a negociação e entrou com força na disputa no dia 30 de julho, um domingo. Três dias depois, na quarta-feira, ele viajou para o Rio de Janeiro.
Como havia pouco tempo para lidar com as burocracias, já que a janela estava prestes a fechar, Vasco e Belgrano optaram pelo empréstimo com obrigação de compra, um modelo mais simples e ágil de negócio. No contrato, estipularam uma meta simbólica: um gol.
Ou seja, Vegetti precisou de 16 minutos em campo em sua estreia (contra o Grêmio, 18ª rodada, quando marcou o gol da vitória por 1 a 0) para obrigar o clube a comprá-lo. Ele já assinou permanentemente o contrato válido até meados de 2025 – caso participe de 60% dos jogos no segundo ano do vínculo, a renovação por mais seis meses será automática.
O gol de Vegetti contra o Grêmio foi o primeiro do Vasco em São Januário neste Brasileirão e rendeu o primeiro ponto conquistado pela equipe no estádio. De certa forma, também foi o ponto de partida para a reação – a partir dali, o time engatou uma sequência de bons resultados e deixou a zona de rebaixamento.
Para comemorar, o atacante cobriu um dos olhos como um pirata, fazendo referência ao ex-clube que defendeu por quase cinco anos e do qual saiu às pressas. Assim como seus pais, ele também não conseguiu se despedir adequadamente.
– No Belgrano, Pablo criou um sentimento de pertencimento muito forte. Os torcedores gostam muito dele, é um ídolo. Ele não só marcou muitos gols, mas também mostrou o caminho para que o clube pudesse crescer – contou Hernán Bernardello, ex-companheiro de equipe, amigo e atual agente do atacante vascaíno.
Hernán acredita que, como os torcedores do Vasco pareceram ter gostado, ele continuou comemorando dessa forma. Alguns gols depois, essa celebração pegou de vez, especialmente entre os mais jovens. Com apenas dois meses de clube, Pablo Vegetti se tornou uma referência.
Vasco: sua maior aventura
Apesar de amar futebol desde pequeno, Pablo não era como outros meninos que sonhavam em jogar em gigantes como River Plate ou Boca Juniors. Isso exigiria que ele saísse de Santo Domingo, onde cresceu e viveu a maior parte da vida. Algo que o assustava.
– Ele não queria jogar futebol em outros lugares. Dizia: ”Não vou porque quero ficar com minha família e meus amigos”. Não queria porque queria estar em casa, em seu povoado – lembrou Alejandra, que continua morando na pequena vila.
– Eu sempre dizia: ”Pablo, existe um mundo além disso”.
Filho de um caminhoneiro e de uma professora de Educação Física, Pablo teve uma infância humilde na província de Santa Fé. Sempre jogou bola, sendo levado pelos pais ou conhecidos quando havia jogo em outros lugares, mas se tornar jogador de futebol não era sua primeira opção. Seguindo o exemplo da irmã mais velha, Guillermina, que se formou em Arquitetura, ele ingressou na faculdade de Ciências Contábeis. Depois, tentou Educação Física. Mas não concluiu nenhuma das duas.
Então, Pablo tomou a difícil decisão de sair de casa para tentar ser jogador.
– Ele ama futebol. Ama tanto que decidiu deixar sua cidade, sua família, seus costumes… – explicou a mãe.
– Imagine, vivemos em uma cidadezinha com uma praça e cinco quarteirões, 2 mil pessoas. E ele deixou tudo por essa bola que ele ama – acrescentou.
Considerado velho para os padrões do futebol e sem formação nas categorias de base de algum clube, Pablo lutou para receber uma oportunidade. Ela veio no Villa San Carlos, time da Terceira Divisão, quando já tinha 21 anos, quase 22. Orgulhosos, os pais embarcaram em uma jornada de aproximadamente 5 horas e meia para acompanhar o filho na assinatura do primeiro contrato profissional, mas sofreram um terrível acidente na estrada e quase perderam a vida.
O carro em que estavam bateu de frente com um caminhão, e ambos ficaram com graves sequelas. Reinaldo fraturou o quadril e o joelho, perdeu parte do intestino e passou a usar uma prótese na perna. Teve que se aposentar por invalidez. Já Alejandra teve o rosto gravemente ferido: o impacto quase arrancou seu maxilar inferior.
Os dois passaram por várias cirurgias e se submeteram a um longo processo de reabilitação que durou quatro anos antes de retomarem uma vida normal. Pablo cogitou desistir da carreira de jogador e cuidar dos pais junto com a irmã, mas foi convencido do contrário e começou sua peregrinação por equipes de divisões inferiores. ”Os primeiros anos foram muito dramáticos”, resume Alejandra.
Os primeiros anos se passaram longe dos holofotes, sem nenhum destaque. O atacante chegou a jogar no Gimnasia de La Plata e no Colón, clubes maiores que disputam a Primeira Divisão, mas teve passagens apagadas. A mudança aconteceu apenas em 2019, quando vestiu a camisa do Instituto Atlético Central Córdoba e marcou 15 gols em 23 partidas. Em seguida, transferiu-se para o rival da mesma cidade: o Belgrano.
– Joguei com ele no Belgrano, chegamos juntos ao clube – contou o amigo Hernán, que encerrou sua carreira este ano para se dedicar exclusivamente à agência de atletas.
– O Belgrano é um clube muito grande que estava na Segunda Divisão. Chegamos com o objetivo de subir para a Primeira. Foi muito difícil, passamos por quatro anos para conquistar a promoção. Houve várias mudanças de treinadores, jogadores e dirigentes. Mas eu e Pablo continuamos. Dizíamos: ”Precisamos fazer esse clube subir, precisamos voltar à Primeira Divisão”. E conseguimos no ano passado – completou.
Pablo Vegetti marcou 17 gols e foi o artilheiro da competição na campanha de acesso. Este ano, apesar do Belgrano ter terminado sua primeira temporada de volta à elite em 13º lugar, ninguém fez mais gols do que ele – Pablo e Michael Santos, do Talleres, empataram na artilharia, ambos com 13 gols.
A partir daí, despertou interesse de várias equipes, incluindo o Vasco. O clube do Rio de Janeiro ofereceu um projeto esportivo e financeiro atraente o suficiente para convencer Pablo, que quando criança não queria de jeito nenhum sair dos limites de seu povoado, a viver sua maior aventura. Ele nunca esteve tão longe de casa.
– Quando surgiu a oportunidade no Vasco, Pablo nem pensou duas vezes. Primeiro, porque é um clube enorme, gigante. Tem um treinador como o Ramón, que é excelente. E havia a promessa de que todos os esforços seriam feitos para que o clube crescesse em todos os sentidos e estivesse bem, como um grande clube deve estar. Então, foi tudo muito rápido: fechamos o negócio em um dia e, no dia seguinte, fomos para o Brasil – contou Hernán, antes de concluir:
– Pablo está feliz, está curtindo a cidade, os torcedores o tratam muito bem. Ele está aproveitando.
Fonte: ge