Não há como discutir a seleção brasileira sem mencionar Romário. Para quem o viu jogar ou apenas ouviu histórias, o Baixinho sempre está presente na lembrança. Há 20 anos, o atacante entrou em campo para sua despedida com a camisa do Brasil, em uma vitória por 3 a 0 contra a Guatemala, em um amistoso realizado em 25 de abril de 2005. Embora essa partida não tenha sido a despedida que muitos esperavam, suas emoções a tornaram especial. Vamos relembrar o que ocorreu naquele dia e a trajetória do Baixinho na Seleção.
“Na minha geração, havia uma fome maior de vencer, mais vontade de ganhar. Não quero dizer que a atual geração não tenha essa fome, apenas que a nossa tinha uma intensidade diferente,” disse Romário em uma entrevista ao ge.
Romário, Brasil x Guatemala, 2005, despedida do Baixinho da Seleção — Foto: MAURICIO LIMA / AFP
Antes de sua despedida, Romário retornou ao Vasco em junho de 2005, após dois anos e meio jogando pelo Fluminense, com a expectativa de reviver seus melhores momentos em São Januário. Durante suas passagens anteriores, ele conquistou dois títulos estaduais, uma Copa Mercosul e um Campeonato Brasileiro.
Na ocasião, Romário tinha 39 anos e se aproximava do final de sua carreira, o que pedia uma despedida digna para um ídolo da Copa de 1994. Contudo, o jogo pela Seleção foi modesto: um amistoso contra a Guatemala no Pacaembu, sem os principais jogadores do futebol brasileiro.
Como não era uma Data Fifa, os clubes não eram obrigados a liberar seus jogadores, e o Brasil contava apenas com atletas que atuavam no país. A escalação do técnico Carlos Alberto Parreira foi: Marcos; Cicinho, Anderson, Fabiano Eller e Léo; Mineiro, Magrão, Ricardinho e Carlos Alberto; Romário e Robinho.
Romário com o troféu da Copa do Mundo de 1994 — Foto: Alessandro Sabattini/Getty Images
“Não houve frustração, mas não foi o ideal. Eu gostaria de ter me despedido no Rio de Janeiro, no Maracanã, cercado pelos jogadores que fizeram parte da minha história. Mas nem tudo é perfeito, assim como na vida. De qualquer forma, foi uma despedida especial, pois vestir a camisa da seleção brasileira é sempre significativo,” comentou Romário.
Embora o ambiente fosse diferente do esperado, a atmosfera era de celebração. O Brasil entrou em campo com a tradicional camisa verde e amarela, liderado por Romário, que usava a braçadeira de capitão e o número 11.
Emocionado, Romário chorou ao começar o hino nacional, ao ver as arquibancadas lotadas com cerca de 40 mil torcedores, que o homenageavam. “Valeu, Baixinho! O maior da história dentro da área!” afirmava um dos banners.
A diferença de qualidade entre as equipes permitiu que os torcedores vissem gols rapidamente. O zagueiro Anderson abriu o placar logo aos cinco minutos. Romário tentou marcar várias vezes: de falta, de perto e de longe. Finalmente, conseguiu um gol de cabeça no primeiro tempo, após um cruzamento de Ricardinho.
Durante a comemoração, Romário levantou a camisa da Seleção e revelou uma camiseta branca com a frase: “Eu tenho uma filhinha down que é uma princesinha.”
Aquele dia sinalizava o fim de um capítulo em sua vida profissional, mas também o início de outro igualmente importante em sua vida pessoal – passar a ser pai de Ivy e defensor das pessoas com deficiências, uma causa que posteriormente moldaria sua carreira política.
“Entender a importância de transmitir essa mensagem como pai de uma criança com síndrome de down foi fundamental. Muitos pais têm preconceitos e receios em mostrar seus filhos. Aproveitei essa oportunidade para impactar positivamente suas mentalidades. Entrei na política em 2010, defendendo as causas das pessoas com deficiência, e depois ampliei para incluir pessoas com doenças raras e também questões do esporte,” relatou.
A comemoração poderia ter sido ainda mais grandiosa, não fosse um gol anulado. Romário fez o segundo gol aos 26 minutos, mas o juiz invalidou a jogada.
Ele foi substituído aos 38 minutos, entrando Grafite em seu lugar. Despedindo-se sob aplausos e gritos de “tetracampeão”, Romário deu uma volta olímpica para agradecer aos torcedores, deixando o campo com a camisa da Seleção pela última vez.
Grafite, o substituto de Romário, marcou o terceiro e último gol, selando o placar em 3 a 0 a favor do Brasil. Esse jogo também foi significativo por ser a estreia de Fred, jovem promessa de 21 anos do Cruzeiro, que mais tarde se tornaria um ídolo do Fluminense.
Romário encerrou sua trajetória na Seleção, que teve início em 23 de maio de 1987, e deixou o legado como o terceiro maior artilheiro da história da Seleção, atrás apenas de Ronaldo Fenômeno e Pelé (hoje, Romário ocupa o quarto lugar na lista).
“A seleção brasileira é única e especial. Sou grato pelos jogos que fiz e, principalmente, pelos títulos. A Seleção sempre foi fundamental na minha carreira, sempre dei o meu melhor por ela,” disse Romário.
O futuro mostrou que o atacante ainda tinha energia para jogar mais. Após a despedida, ele continuou a jogar por mais três anos, defendendo o Vasco, Miami FC (Estados Unidos) e Adelaide United (Austrália). Em 2005, ele foi artilheiro do Campeonato Brasileiro com 22 gols e, no ano seguinte, o maior goleador na Liga Norte-Americana, com 18 gols.
“Decidir quando parar é sempre complicado; não temos certeza de quando é o momento certo. A condição física necessária para jogar na seleção é crucial, e com o tempo, a perdemos. Eu percebi que era o momento certo, apesar de ser difícil. Nos primeiros meses e até no primeiro ano após a aposentadoria, sempre existe a sensação de que você poderia ter jogado mais um pouco. E, para ser honesto, desde então, a qualidade do futebol não evoluiu tanto,” refletiu.
Romário pela Seleção
- 70 jogos
- 55 gols
- 2 Copas América (96/97 e 88/89)
- 1 Copa do Mundo (1994)
- 1 Copa das Confederações (1997)
- Medalha de Prata nas Olimpíadas (1988)
Romário finalizou sua carreira em abril de 2008, mas sempre manteve uma conexão com o futebol. Ao contrário de outros jogadores de sua geração, como Dunga e Taffarel, ele não optou por seguir uma carreira técnica. Ele afirma que, por enquanto, não tem interesse em integrar a comissão de um time, nem em assumir um cargo na Seleção.
Ele se dedicou à política, primeiro como deputado federal e, anos depois, como senador, cargo que ocupa atualmente. Em 2024, Romário foi eleito presidente do America-RJ, clube que tem uma forte ligação emocional devido à paixão de seu pai, Edevair.
Agora, sua relação com a seleção brasileira é como espectador e crítico, esperando reviver os áureos dias do futebol brasileiro.
“Se essa nova geração entender a importância da fome de vencer, talvez consiga triunfar. Vejo os atletas se entregando mais por suas equipes do que pela seleção. Não sei se eles estão menos comprometidos com a Seleção, mas a garra é diferente. Em minha época, tínhamos um comprometimento igual nos clubes e na Seleção, e essa é uma diferença importante,” concluiu Romário.
Fonte: ge