A equipe do ge havia acabado de adentrar o campo da Arena Rio de Janeiro, no bairro de Guadalupe, quando um colega cumprimentou Jomar após um excelente passe vertical do defensor. O atleta de 32 anos, um dos poucos campeões da Copa do Brasil com o Vasco que ainda está em atividade, está se preparando para a batalha da Série B2 do Campeonato Carioca, que é equivalente à quarta divisão, pelo Futebol Clube Rio de Janeiro.
Jomar iniciou sua trajetória no Tigres do Brasil, mas se profissionalizou no Vasco, equipe onde jogou entre 2011 e 2018. Além do título da Copa do Brasil, ele também foi bicampeão carioca. Mesmo não tendo atuado na campanha do título nacional, fez parte do elenco que ergueu a taça e vestiu a faixa.
– Tive um bom desempenho na base e subi rapidamente, durante a época do Ricardo Gomes. Era uma equipe muito forte, com Dedé, Anderson Martins, Diego Souza… Coisas que eu só imaginava e passei a vivenciar. Foi um ano excelente, cheio de aprendizado, e realizei o sonho de jogar ao lado de grandes jogadores e ser campeão. Ser campeão da Copa do Brasil é algo extremamente significativo, vivenciar aquele momento foi inexplicável – afirmou Jomar em entrevista ao ge.
– Dedé brincou comigo: “Campeão da Copa do Brasil, né?”. Um sonho que eu vivi, nunca imaginei que chegaria a esse ponto. Dedé é um atleta fora de série, me ajudou muito, assim como Rodolfo e Anderson Martins. Sempre me incentivavam: “Você vai ser campeão, hein?! Vai vestir a faixa”. Vamos com tudo, né? (risos). Eu tinha 18 anos, foi uma felicidade imensurável. Essa faixa está emoldurada na minha casa e nunca sairá, eternizada – completou o defensor.
Jomar, ex-Vasco, recomeça carreira em clube da Série B2 do Carioca — Foto: Emanuelle Ribeiro
O Vasco foi o clube que mais marcou a trajetória de Jomar até aqui. Foi em São Januário, onde ingressou na base, que o defensor ganhou o apelido de Jomito, em homenagem a um ídolo seu e do clube, e é assim que ainda é chamado nos campos do Rio.
– Dedé e eu tínhamos estilos de jogo parecidos. Eu era técnico, rápido e ágil. A torcida começou a chamá-lo de Mito, e quando ele saiu, passaram a me chamar de Jomito. Recentemente fui a São Januário, no jogo contra o Athletico-PR, e muitas pessoas pediram para tirar fotos comigo. O tempo passa, mas o carinho permanece, e eu nutro grande admiração por essa torcida que me acolheu em todos os momentos – relembrou ele, que continuou:
– São Januário foi meu lar por oito anos. Conquistei muitos títulos, Copa do Brasil, Cariocas, e sou eternamente grato. A torcida é apaixonada e eu a amo sem limites. Espero sempre estar em São Januário torcendo pelo Vasco e que consigam avançar nessa semifinal.
Jomar marcou seu único gol pelo Vasco em clássico contra o Botafogo, em 2013 — Foto: André Durão/ge
A próxima partida da semifinal da Copa do Brasil entre Vasco e Atlético-MG está marcada para este sábado, às 18h30, em São Januário. O time mineiro ganhou o jogo de ida por 2 a 1. Se o Vasco vencer por um gol de diferença, a decisão irá para os pênaltis – qualquer diferença maior classifica o Vasco.
– Jogar naquele Caldeirão é sensacional. O Atlético pode esperar um São Januário fervendo. Tenho certeza que o Vasco vai sair vitorioso! – profetizou Jomar.
“Essas memórias me motivam a não desistir”
Durante seu tempo no Vasco, Jomar foi emprestado para três clubes: Rio Branco-SP, Oeste-SP e Oriente Petrolero, da Bolívia. Não conseguiu se firmar como titular e deixou o clube carioca após 57 jogos e um gol. Passou por Iporá-GO, Fluminense-PI, Retrô-PI, River-PI, União Atlético-TO, Humaitá-AC e Sampaio Corrêa-RJ antes de chegar ao Rio de Janeiro.
– Eu não tinha a intenção de seguir essa carreira, isso era mais um desejo do meu irmão. Meus pais enxergaram um talento em mim. Foi bastante difícil; enfrentei problemas familiares e não havia estabilidade financeira para continuar, mas minha mãe lutou muito para que eu pudesse ter essa oportunidade – recordou.
Jomar com Alecsandro no Vasco em 2011 — Foto: Vasco da Gama
Criado no bairro de Costa Barros, na zona norte do Rio, Jomar atualmente vive com a família em Campo Grande, na zona oeste, e usa a experiência adquirida em 14 anos de carreira para perseverar. Em sua história, ele carrega os títulos cariocas de 2015 e 2016.
– O grupo era muito unido. Tínhamos plena confiança no que poderíamos alcançar nas competições. Ver minha família torcendo por mim, minha esposa, meus pais e meu irmão é algo que não tem comparação. Eu fiz um gol no Campeonato Brasileiro também, contra o Botafogo. Estávamos perdendo de 2 a 1, empatamos e quase viramos com uma falta do Juninho Pernambucano. Essas memórias me motivam a não desistir do futebol, me fazem querer conquistar muito mais.
Em sua passagem pelo Vasco, o zagueiro também ficou marcado por um confronto com Fred, ex-atacante do Fluminense, em 2013. O duelo do Brasileirão celebrou a reabertura do Maracanã após a reforma para a Copa do Mundo. Aquela foi a temporada em que Jomar entrou em campo com mais frequência e foi considerado essencial para a equipe.
– Foi minha estreia no Maracanã. Inicialmente, eu nem iria jogar, mas o Renato Silva não se sentiu bem no hotel e eu entrei em seu lugar. Minha perna tremia um pouco, porque o Fred tinha sido artilheiro da Copa América e eu estava prestes a enfrentar um cara que tinha muita experiência. Foi um confronto importante que guardo comigo, pois consegui expulsá-lo – contou.
– Não posso afirmar que o deixei na sombra, mas ele tentou me intimidar e eu usei a astúcia da minha comunidade, fui pra cima dele, porque precisamos ganhar a vida, né? Fred já havia conquistado bastante, tentou usar a experiência para me desestabilizar, mas consegui sair por cima e ele foi expulso. Ganhamos de 3 a 1. Pacote completo. A torcida até hoje comenta sobre esse lance. É legal ser lembrado por isso – acrescentou Jomar.
De campeão da Copa do Brasil à quarta divisão estadual
Após viver a glória de atuar em um dos maiores clubes do Brasil e conquistar títulos importantes, Jomar tenta se adaptar à nova realidade que encontrou após o Vasco. No Rio de Janeiro, ele busca manter o ritmo e recuperar a visibilidade para relançar sua carreira.
– Essa transição é bastante complicada. Já estive no topo, agora estou aqui, tendo que me adaptar a um estilo diferente de competição. O desgaste é intenso, todos brigando por uma oportunidade, e não apenas para permanecer. Isso é bom para mim, pois estou tentando seguir em frente, não quero parar aqui, desejo mais cinco ou seis anos de carreira. Thiago Silva ainda está jogando aos 41. Preciso aceitar essa realidade, virar a página, mas não descarto retornar a jogar uma Série B ou Série A. Luto para isso enquanto tiver saúde, talento e qualidade. A batalha é diária.
Os atletas do Rio de Janeiro não recebem para jogar. O intuito de todos ali é abrir portas para um futuro no futebol, e Jomar se tornou uma referência para os garotos.
– Ao chegar aqui, as pessoas me enxergam como um líder, um espaço onde sou respeitado, o que me motiva a continuar. Tento transmitir experiência; quando cheguei, os meninos ficaram surpresos: “O Jomar vai vir mesmo?”. É um sentimento gratificante. Digo a eles que precisamos lutar pelos nossos sonhos, pois as famílias sacrificam para que eles venham treinar, então é fundamental que acreditem nos próprios sonhos e coloquem o talento em prática – destacou Jomar.
– Este ano precisávamos de pessoas comprometidas com o trabalho, pessoas sérias, e ele foi um dos nomes que destaquei. Foi aceito de imediato. Ele está aqui e só o deixarei sair quando garantir o acesso pra gente (risos) – comentou Daniel de Oliveira, companheiro de time, que faz de tudo para ajudar a manter o clube de Guadalupe em funcionamento.
Treino do Rio de Janeiro, clube que Jomar defende — Foto: Emanuelle Ribeiro
A atividade que o ge acompanhou na quarta-feira, no centro de treinamentos na zona norte do Rio, foi um treino coletivo na véspera do confronto contra o Niteroiense, pela quarta rodada. O Futebol Clube Rio de Janeiro estava perdendo por 1 a 0, mas devido às condições ruins do gramado do Estádio Joaquim de Almeida Flores, na cidade de Nilópolis, a partida foi interrompida no intervalo. O duelo foi retomado nesta quinta no Estádio de Moça Bonita, em Bangu, e o adversário confirmou a vitória.
Jomar não entrou em campo – o zagueiro deve fazer sua estreia na próxima rodada, contra o Serra Macaense, fora de casa. É aí que começará mais um sonho para o ex-jogador do Vasco.
– Não descarto nenhum sonho: jogar uma Série A ou mesmo atuar fora do Brasil. Eu tive uma proposta para ir para o Paços Ferreira, de Portugal, mas o Vasco não liberou e eu não pude viajar, pois o time precisava de zagueiro na época. Esse é um desejo que carrego e, enquanto tiver saúde, seguirei com a determinação de alcançar. Quando você está parado, as coisas não acontecem como deseja, mas quando está ativo, tudo flui e funcionará se eu estiver na trajetória certa – finalizou o zagueiro.
– Estou bastante focado no futebol, concentrado no que quero. Preciso me dedicar aqui para alcançar meu objetivo. Ajudo minha esposa de vez em quando; ela trabalha alugando decoração para festas, e estou determinado a fazer nossa situação melhorar. Desejo mudar de vida. Algumas pessoas se espelham em mim. Chego na minha comunidade, vejo a alegria das crianças, e um menino que está começando a jogar já o chamam de Jomar. Isso me dá motivação – concluiu Jomar.
Fonte: ge