Russo é conhecido por sua personalidade animada e hoje recorda com nostalgia seu tempo como jogador. Ele reconhece os arrependimentos e não tem receio de admitir que faria escolhas diferentes. Enquanto sua habilidade em avançar pelo lado direito e sua velocidade eram marcantes em campo, fora dele chamava atenção pelos excessos.
“Se tivesse sido mais cuidadoso, teria alcançado um patamar maior, o corpo precisa de descanso. Naquela época, não tinha alguém para me aconselhar. Era jovem, com muito dinheiro, carros, solteiro. Após o jogo, saía para curtir o samba, cerveja, era o que me agradava”, comentou Russo.
– Se eu tivesse a mentalidade que tenho hoje, agiria de forma contrária, me cuidaria mais, valorizaria minha profissão. Faria diferente. Mas veja bem, saindo de uma comunidade carente, onde nada tinha, e, de repente, vendo uma transformação tão rápida na minha vida. Tudo aconteceu muito rápido mesmo. Seleção, dinheiro, carro, fama. Era difícil lidar com tudo isso. Atualmente, os jovens têm tudo. Contam com profissionais cuidando de suas imagens, de suas finanças. Ah, como eu gostaria de ter tido isso na minha época. Tudo é bem diferente agora.
– Eu mesmo, não tinha ninguém para me orientar, pelo contrário, permitia a aproximação de todo tipo de pessoa, pessoas boas, pessoas ruins.
Na verdade, até tinha. Russo recorda de um importante conselho do então técnico Emerson Leão.
– Ele dizia: ‘Russo, você é jovem, e eu também fui jovem. Já aproveitei muito. Mas precisamos nos cuidar. Você não é de ferro. Depois que passar dos 30, sentirá as consequências.’ Isso se concretizou, rapaz… O aviso dele foi preciso.
De fato, Russo teve uma carreira de destaque até os 30 anos. Defendeu grandes clubes, sempre competindo na Série A, chegou a uma final de Libertadores e, é claro, vestiu a camisa da Seleção.
E é justamente aí, com a camisa amarela, que essa trajetória tem início.
Salvador, Bahia.
No estacionamento do Barradão, Russo esperava dentro do automóvel. Ao longe, observou uma movimentação incomum mais à frente. Não era comum a presença de tantos repórteres num treino cotidiano do Vitória. Desconhecendo o motivo e receoso de uma reprimenda, optou por esperar. Contudo, o horário de início do treino se aproximava. “Preciso ir”.
Russo deixou o carro e, portando seu equipamento de treino, dirigiu-se à entrada dos jogadores. Sem perceber, viu todos se aproximarem dele. A imprensa estava lá para entrevistar a surpresa convocada pelo treinador Zagallo para a Seleção, que disputaria um amistoso contra o México, nos Estados Unidos.
Mesmo diante disso tudo, ainda foi difícil acreditar que havia sido chamado para a Seleção.
– Não conseguia acreditar na convocação. Somente à noite, ao ver no Jornal Nacional, acreditei. Foi uma felicidade imensa.
Naquela época, Russo tinha 21 anos e acabara de chegar ao Vitória. Apenas dois anos antes jogava futebol de rua quando foi observado pelo técnico Cauly, que o levou para o Sport. Após um rápido teste, Nereu Pinheiro, então treinador da base e responsável por revelar nomes importantes do clube nos anos 90 como Adriano, Leonardo e Juninho Pernambucano, identificou o potencial do jogador. Aprovado, passou a treinar com os times de base.
O futebol na década de 90
Em 1996, estreou como profissional pelo Sport sob o comando de Hélio dos Anjos. Logo em um clássico contra o Santa Cruz. Naquela época, saía de casa, na comunidade do Detran, e pegava um ônibus para treinar diariamente na Ilha do Retiro. A mudança do time de base para o time principal lhe proporcionou um aumento salarial.
– Recebia uma ajuda de custo de R$ 75 e vale transporte. Após me tornar titular no Pernambucano, o Coronel Adelson (Wanderley, dirigente do Sport) decidiu aumentar meu salário: de R$ 75 para R$ 350. Uma grande evolução. Passei o ano inteiro com esse salário.
Foi um ano marcante para Russo, fazendo parte de um time com outros jogadores importantes na história do Sport, como Adriano, Chico Monte Alegre, Dedé, Dário, Chiquinho, Marcelo e Luís Müller. Conquistaram o título pernambucano.
Essa mesma equipe disputou a Série A do Campeonato Brasileiro, chamando a atenção para dois jogadores em especial: Russo e o meia Chiquinho. Ao fim da temporada, o Vitória recrutou ambos. O Valencia chegou a demonstrar interesse pelo jovem lateral, porém, sem acordo, ambos foram para a Bahia para a temporada de 1997.
Russo afirma que o Vitória realmente queria Chiquinho, um habilidoso meia que se destacava mais nas partidas.
– Fui praticamente “de graça”, juntamente com Chiquinho. Eles, na verdade, queriam ele.
A carreira de Russo foi meteórica. A convocação para a Seleção veio após apenas quatro meses no Vitória. No elenco brasileiro, que vivia o ciclo da Copa do Mundo, encontrou estrelas de renome. No amistoso contra o México, ficou no banco e não entrou em campo. Mas durante os treinamentos para o jogo, esteve ao lado de jogadores como Cafu, Roberto Carlos, Leonardo, além da dupla Romário e Ronaldo.
Aquele foi o período breve da dupla Ro-Ro na Seleção. Os craques Romário e Ronaldo atuaram juntos apenas 19 vezes pela Seleção.
Reserva de Cafu
O desafio era conquistar lugar na equipe. Reserva na Copa de 1994, Cafu havia assegurado a posição de titular. Zagallo buscava um reserva para ele. Zé Maria era a primeira opção, mas lidou com uma série de lesões, levando o técnico a procurar alternativas. Uma delas foi Russo.
– Na Seleção, acredito que faltou mais oportunidade. Fiquei de reserva de Cafu e joguei pouco. Ele era indiscutível e difícil de ser substituído, além de muito dedicado nos treinamentos – recorda.
Além dos amistosos, Russo competiu em duas competições oficiais pela Seleção, entre 1997 e 1998: a Copa das Confederações, da qual o Brasil saiu campeão, e a Copa Ouro. O lateral alimentou a real expectativa de disputar a Copa do Mundo na França.
“Os mais cotados para ir éramos eu e Zé Maria. Ele se machucou, mas eu também. Tinha esperança. Participei da Copa das Confederações, Copa Ouro. Pensei: ‘A próxima é a Copa'”.
Porém, não aconteceu. Em 1998, Russo já havia sido transferido para o Cruzeiro. Continuava no radar de Zagallo como opção para a lateral direita, porém sofreu uma lesão muscular na fase de convocação. Flávio Conceição foi chamado como volante e lateral-direito, mas acabou sendo cortado. Por fim, Zé Carlos, na época no São Paulo, foi convocado e atuou na semifinal contra a Holanda, devido à suspensão de Cafu.
– Fiquei muito desanimado e triste. Esperava ser chamado, era meu sonho.
Do período na Seleção, Russo guarda a convivência com estrelas como Romário, Ronaldo, Edmundo e Denílson.
– De fora, temos uma percepção diferente. Achei que muitos jogadores fossem prepotentes. Entretanto, quando convivemos com eles, a visão muda. Eles foram muito receptivos comigo. O (Ronaldo) Fenômeno, seja rico ou pobre, mantém sua simplicidade. O mesmo vale para Romário. Na minha primeira convocação, contra o México, não consegui dormir. Foi só no dia seguinte. Custei a acreditar que estava lá. Acostumado a vê-los pela televisão, sair da comunidade e estar ao lado deles, dos melhores do mundo. A ficha demorou a cair – relata Russo.
O fim do sonho
Tão rápido quanto surgiu, o sonho terminou ali. Foi o ponto final das passagens de Russo pela Seleção. Depois de 1998, não foi mais convocado. Porém, continuou atuando em alto nível por um bom tempo, afinal, naquela época, tinha apenas 23 anos. Foi titular em equipes emblemáticas, como o Sport de 1998 e 2000, esteve em momentos cruciais como a final da Libertadores com o São Caetano, experimentou sua primeira experiência internacional, mas foi frustrado pelo rigor do clima frio da Rússia e retornou após ter entrado em campo apenas duas vezes.
Após a aposentadoria, Russo permaneceu em sua terra natal. Em Pernambuco, optou por descansar. Tentou brevemente uma carreira como treinador, porém não prosseguiu. No entanto, há dois anos, sentiu o desejo de mudar. Deixou o Brasil e se mudou com a esposa para Portugal. Atualmente reside na cidade de Leiria, onde ministra aulas para jovens ao lado de um amigo brasileiro, que também foi jogador. O anseio de se tornar técnico retornou e ele está cursando a formação para seguir nessa profissão.
– Esse foi um dos motivos que me fez vir para cá. Certa vez, estava em casa com minha esposa e disse a ela: vamos morar em Portugal?! Então, há dois anos viemos – conta Russo, descontraído.
Russo compartilha sua experiência passada em cada clube por onde passou durante sua carreira:
Sport – 1998
Após a decepção de não ter ido à Copa, recuperado da lesão, Russo foi procurado pelo Sport. Era o momento de retornar, agora como um jogador de destaque para integrar um time robusto.
– Tínhamos um grupo muito forte. Tínhamos potencial para conquistar o título brasileiro naquele ano. Creio que quem levou foi o Corinthians, que também possuía uma equipe de alto nível. Acabamos perdendo para o Grêmio.
Embora tenha feito uma excelente temporada, o Sport atravessava um período político conturbado. Com a mudança para 1999, todo o time foi desfeito. Russo não conseguiu uma transferência para a Europa e acabou retornando ao Vitória.
Vitória – 1999
– A diretoria do Sport desmontou o time inteiro e aceitei voltar ao Vitória, que me fez uma proposta interessante. Decidi focar nessa volta, buscando um bom desempenho no Campeonato Brasileiro para depois tentar uma transferência para a Europa. Conseguimos um bom desempenho na competição, tanto que recebi várias propostas naquela época.
Botafogo – 1999
Uma oferta vantajosa atraia Russo no segundo semestre de 1999. Contudo, aquele não foi um bom ano, e o lateral compartilha os detalhes dos bastidores daquele grupo.
– Botafogo? Ali ocorria muitas intrigas. Sandro (ex-zagueiro) era nosso capitão, contudo, os atletas achavam que a faixa deveria ser dada aos cariocas. Muitas reuniões, muitas confusões. Até que, em um momento, Sandro se exasperou. Um dia, no vestiário, ele pegou a faixa e declarou: “Aqui está, não sou mais capitão do Botafogo”. A partir daí, o grupo se dividiu. Passamos todo o Brasileiro brigando para não ser rebaixados. Escapamos apenas na última rodada, em um confronto contra o Guarani, se não me engano.
O Botafogo deveria ter sido rebaixado para a Série B naquele ano, porém foi salvo pelo “caso Sandro Hiroshi”, uma disputa judicial que tirou pontos do São Paulo, beneficiando Internacional e Botafogo. Como o rebaixamento era baseado na média naquela edição do campeonato, o Alvinegro escapou, e o Gama foi rebaixado para a segundona.
Sport – 2000
– Quando você veste a amarelinha, é valorizado, não é mesmo? Tudo fica maior. No começo no Sport, eu recebia uma ajuda de custo de R$ 75 e vale transporte. Após tornar-me titular no Pernambucano, o Coronel Adelson (Wanderley) decidiu aumentar o salário. De R$ 75 foi para R$ 350. Um aumento significativo. Cheguei nessa passagem bastante valorizado. E a equipe era sensacional. Fomos pentacampeões pernambucanos, e o técnico Leão foi para a Seleção.
Santos – 2001
– O Santos já demonstrava interesse em me contratar há algum tempo. Consultaram Leão, que afirmou: “Pode levá-lo, é um bom jogador”. A transferência ocorreu logo após o Brasileiro. Eu tinha expectativas no Sport, porém não se concretizaram. No Santos, possuíamos um grupo bastante forte, com Fábio Costa, que já conhecia do Vitória, Léo, Elano, Renato, Dodô, Caio, Deivid. Enfrentamos o Corinthians em uma semifinal que parecia uma final antecipada. Quem vencesse ali seria campeão, pois enfrentaria o Botafogo-SP. Havíamos marcado cinco gols no último confronto. No entanto, acabamos perdendo, sofrendo um gol do Ricardinho faltando 20 segundos…
São Caetano – 2002
– No Santos, salários estavam atrasados. O São Caetano me procurou, garantindo pagamento em